terça-feira, 30 de junho de 2009
2 de julho
Estamos a poucos dias da data magna da Bahia, cabendo uma reflexão sobre o significado da grande data para o povo baiano, tão esquecido dos feitos do passado quanto envolvido pelas repercussões dos escândalos de hoje Ao invés, pois, de divulgarmos aqui e agora os desmandos ocorridos no meio político do país, dos quais nos envergonhamos, recordamos fatos e personalidades que nos enchem de orgulho, porque falam da bravura e do patriotismo da nossa gente.
Para tanto valem rememorados episódios curiosos relacionados com a preparação do centenário do Dois de Julho e as providências adotadas pelo governo central para as comemorações do centenário da independência nacional a partir da criação da comissão executiva do memorável acontecimento. Tal circunstância ocorreu a 14 de novembro de 1919. Naquela oportunidade, seguiu para Lisboa o historiador baiano, Braz do Amaral, a fim de conhecer o que disseram os portugueses sobre a campanha pela independência. Entretanto, lá não se deteve por muito tempo, convocado que foi a voltar ao país a fim de defender os interesses da Bahia, na conferência de limites, reunida de junho a julho de 1920, no Rio de Janeiro.
Todavia, solicitou Braz do Amaral algumas cópias dos autos do processo a que foi submetido o general Madeira de Melo, após evacuação de Salvador, que lhe foram enviadas com autenticação do Arquivo Histórico Militar de Portugal. Além dessas peças, analisou outros documentos do Arquivo Público da Bahia e manuscritos da Biblioteca Nacional, com os quais elaborou o livro História da Independência da Bahia, editado, pela primeira vez, em 1923, seguindo-se a edição de 1957.
Já àquela altura o historiador baiano destaca o papel desempenhado pelo governo interino de Cachoeira, a quem atribui o sucesso da campanha. Com efeito, a sublevação das vilas do Recôncavo exerceram papel essencial naquele episódio memorável da nossa história, pois foram seus dirigentes que organizaram a reação contra o domínio português.
Autores renomados de ontem, como Braz do Amaral, e de hoje, que são muito numerosos, consideram como ponto inicial para a conquista da independência pátria a abertura dos portos do Brasil ao comércio com as nações estrangeiras, sugerida ao príncipe regente D.João por José da Silva Lisboa, futuro Visconde de Cairú. Os acontecimentos se precipitaram também após a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido e, especialmente, depois da revolução portuguesa de 1820.
Tendo sido editado, pela segunda vez, há 48 anos, julgo pertinente fazer nova edição do livro pioneiro de Braz do Amaral, não só por ser obra de consulta de referência obrigatória, como por não ser localizada facilmente na biblioteca do nosso Estado.
Este texto pretende, pois, exaltar o trabalho de um dos mais ilustres historiadores da Bahia, nascido em Salvador a 2 de novembro de 1861. Era seu pai o Capitão do corpo de Polícia de Salvador, Braz Hermenegildo do Amaral e sua mãe Josefina Virgínia do Amaral.
Relata Marieta Alves ter seu genitor participado “com destaque” da guerra do Paraguai, de onde voltou com o peito coberto de medalhas, e a venera de Cavaleiro da Ordem de Cristo recebida em retribuição pelos serviços prestados à causa pátria.
Filho de família sem recursos, ainda cursando humanidades, atuava como professor particular para suprir as dificuldades pecuniárias do dia a dia.
Graças ao próprio empenho, Braz do Amaral matriculou-se na Faculdade de Medicina da Bahia, tendo alcançado, pela aplicação aos estudos, o internato na cadeira de cirurgia. Em 1886 diplomou-se médico, alcançando pouco depois o cargo de professor adjunto, preparador e substituto de clínica obstétrica e das cadeiras de patologia externa e clínica cirúrgica da Faculdade de Medicina da Bahia.
Não foi, todavia, como médico que se projetou na Bahia e no Brasil, mas como professor de história pátria e universal no Ginásio da Bahia, estabelecimentos particulares de ensino e, especialmente, historiador da sua terra.
Homem de cultura e de saber, foi um dos fundadores do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, em 1894. Na instituição ocupou vários cargos até falecer em 2 de fevereiro de 1949, quando a Bahia se preparava para festejar seus quatrocentos anos de fundação e fora ele escolhido presidente da Comissão Organizadora do Primeiro Congresso de História da Bahia.
Autor de numerosos trabalhos destacam-se anotações feitas nos seis volumes das “Memórias Históricas e Políticas da Bahia”, de Inácio Acciolli e nas “Recopilações de Notícias Soteropolitanas e Brasílicas”, de Luiz dos Santos Vilhena, sem falar na “História da Bahia do Império à República”, “História da Independência da Bahia”, “A Conspiração Baiana de 1798” e “Recordações Históricas”.
Escreveu e publicou “Discursos e Conferências”, na condição de orador do Instituto, além de colaborar em sua revista. Escritor e historiador foi membro da Academia de Letras da Bahia, tendo ocupado a cadeira nº 4, cujo patrono é o historiador Sebastião da Rocha Pita.
Sobre a retirada de Madeira de Melo da Bahia, Braz do Amaral assinala: “Fica fora de dúvida que: a causa determinante da evacuação da Bahia pelas tropas portuguesas, foi a falta de víveres”. Acrescentando a informação conclui: “Também se averigua pelos documentos aí juntos que a retirada estava prevista nas instruções mandadas pelo governo de Lisboa ao comandante da Praça, pois refere ele, claramente, que lhe fora recomendado, no caso de não se poder manter na Bahia, a evacuação da cidade, destruindo tudo o que não pudesse levar de vitualhas e material bélico, o que explica ter Madeira de Melo evitado a capitulação”.
Recordá-lo neste instante é homenagear um baiano ilustre que se ocupou da história da sua terra, tratando com especial interesse a campanha do 2 de Julho.